quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Macacos no Sótão

Carpinejar afirmou hoje no twitter 'É frustrante para uma ciumenta namorar um homem comportado.' Foi quando um grupo de macacos sapateadores ocupou meu sótão.  

Formou-se um eco ensurdecedor naquele pedaço de mim e tive de parar para refletir. e sentir. Respirei fundo naquela frase, tentei que cada palavra entrasse pelas narinas junto com o ar e inundasse o sótão, arejasse as idéias. Ainda assim, havia ainda um incômodo. Meu cérebro concorda integralmente com Carpinejar, enquanto meu coração bate a ponta do pé contra o solo e a cabeça balança ao som do tsc, tsc, tsc.

O assunto me lembra Walkíria. O primeiro marido achava que ela não o amava o suficiente por que desde os tempos de namoro o incentivava a ter um tempo dele com os amigos - conversas de bar, jogo de futebol essas coisas - pelo menos uma vez por semana. Ela não era ciumenta e isso o fazia sentir-se menos amado. O coração sorria tranquilo aquelas horas bem vividas dele e dela, cada um experimentando seu próprio espaço. Walkíria* acreditava no amor e na liberdade.

Gostava de dizer que nunca foi traída por ele, embora saiba que até foi. Mas sempre preferiu a ignorância aos pesadelos e às disputas. Não sei se foram felizes, mas certamente, ela teve dez anos de noites inteiras de sono.

Depois que a relação acabou, Walkíria teve alguns parceiros até encontrar um novo companheiro. Dizia-me que com ele desceu ao inferno. O homem era compulsivo por sedução, enlaces, enfim por mulheres. Ela chegou a pesar 44 kg e toda sua tranquilidade voou pela janela sempre aberta às novas aventuras dele. Traições sucessivas a deixaram paranóica e ela não conseguia sair do lugar. Ele era compulsivo por mulheres, ela compulsiva por ele. Depois de três anos de conselhos de amigas e de repetir para si mesma 'ele não vai mudar, sou eu quem tem de mudar', deixou-o em silêncio.

Cinco anos de terapia e abstinência de afeto depois, viu-se diante do mar. Primeiro a ponta dos dedos, um pé, depois o outro. Sentiu cuidadosamente o terreno, deixou-se envolver pela água morna dos sentidos, por fim entregou-se às ondas sutis que a invadiram. Ele era mar calmo, com poucas ondas e nenhuma arrebentação. Confiou como nunca, confiou como antes.

Até o dia que a rede lhe trouxe notícias de uma vida dupla. Ligou aos prantos em  pleno dia dos namorados. Era o fim, dizia ela. Saímos para um chopp e os soluços foram substituídos pela prosa divertidas dos amigos. Terminou a noite começando uma nova trajetória. 

Uma semana depois já estava naqueles braços de novo, ouvindo promessas de amor eterno e acreditando na célebre frase dos incautos 'Eu vou mudar'. Nunca mais foi a mesma e ele, aparentemente comportado, continuou o mesmo. 

Será que ela se sente frustrada por ele estar comportado ou por sabê-lo o mesmo?

*Walkíria é nome fantasia em respeito a privacidade da amiga em questão.



3 comentários:

  1. Só andar no caminho vai resolver a dúvida.

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  2. acho que depende. se comportado for sinônimo de comprimido, fica difícil não se frustrar. é duro conviver com alguém que se contém perto da gente.

    o que mais gosto no amor é esta possibilidade que o outro nos oferece para o auto-conhecimento e o desenvolvimento integral do nosso humano.

    adorei o texto e fiquei aqui, pensando sobre o ciúme - aquele que dói nos cotovelos. =)

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  3. E tem o sempre sábio conselho da história: um amor sem conversa, sem assunto, sem temas para seguir conversando antes e depois do amor, não é amor...
    Vida Longa ao Blog da Maria Claudia

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