sexta-feira, 23 de julho de 2010

Diário de Bordo - Porto Alegre

Experimentando Porto Alegre novamente, tive a oportunidade de reencontrar o Zaffari e, de certo modo, rever a vivência anterior. 

Pude ainda, praticar meu esporte predileto: provar comidinha de rua  (hei de escrever um guia de comidinhas de rua qualquer dia). Afirmo, sem qualquer dúvida, que experimentei o melhor cachorro quente das últimas décadas. Perde apenas para o dog da minha mãe. 


Como tudo o que se come por aqui, era enorme. Duas saborosas salsinhas (eu não quis o big), abraçadas por pão fofo e quentinho, cobertas por espesso molho de tomades, adornados com milho verde; para complementar ervilhas (uma mania gaúcha), muita salsa picada e uma generosa cobertura de queijo parmesão artesanal ralado. Um espetáculo para os olhos, uma dádiva para o estômago, um afago para o coração. 

Sim, o famosíssimo cachorro quente do Rosário (colégio particular localizado em frente à praça Dom Sebastião), no Centro de Porto Alegre, afaga a alma, trazendo para a boca o gosto de uma adolescência recheada de afeto e alegria.

Mas a experiência gastronômica não se restringiu ao dogão. Visitei também O Moita (Avenida Ipiranga, 2800 - Azenha, Porto Alegre), especializado numa da instituições da gastronomia de rua gaúcha: o Xis. Xis é um sanduíche gigante recheado com ingredientes muitas vezes inusitados, com resultados saborosíssimos. 

Um dos mais tradicionais, o Xis Coração, vem com corações de frango grelhados, alface, tomate, maionese, ovo (opcional), queijo, milho e ervilha (a mania gaúcha). Outros exemplos de recheio são  o estrogonofe (testado e aprovado),  o campeiro (hamburguer, calabresa, coração, bacon) e o Xis Calabresa, que dispensa apresentações. A experiência foi impressionante tanto pelo sabor, quanto pelo tamanho. Eu confesso que não sou capaz de comer um inteiro, fico com um quarto do tamanho e o mesmo sabor de Xis.  

Outra experiência bem bacana no Moita foi a Torrada. Se você pensou em duas fatias de pão de forma crocantes, acertou apenas em parte. A Torrada gaúcha corresponde a um misto quente turbinadíssimo. No meu caso, escolhi uma Torrada de Filé, composta por um delicioso bife de filé, queijo, presunto, maionese, tomates e alface, envolvidos por duas maravilhosas torradas tal qual as conhecemos. 

Tudo isso para afirmar que a comida de rua em Porto Alegre é de primeiríssima qualidade e espetacular sabor. Vale a pena conferir!

terça-feira, 20 de julho de 2010

L'Advsersaire (france, 2001)

O Adversário, dirigido por Nicole Garcia, lançado em 2002 recebeu a Palma de Ouro de melhor filme. Baseado em fatos reais conta a história de Jean-Marc Roman que matou a esposa, os filhos e os pais.

Do drama sai a seguinte frase, escolhida por P.Fendler:  

'' Diga-me Jean, por que as mulheres que mais nos excitam não são aquelas com quem podemos viver?''


O desafio de seguir o projeto é maior que o de Julie Powell. Naquele caso, ela cozinhava receitas de Julia e registrava em seu blog as alegrias e dissabores da experiência. Neste caso, o registro dos dissabores torna a experiência uma exposição em carne viva.

Não sei se por ter perdido o hábito de escrever com regularidade ou se por ter me deixado conduzir pela ilusão de escrever somente por impulso e inspiração, mas o fato é que a frase - notável - não conseguiu arrancar de mim mais que esse desabafo infantil.

Talvez o fato de não estar em casa, perto de fontes de consulta e de um cenário conhecido. Talvez o frio que me gela os ossos, talvez a própria incapacidade de organizar as idéias relativas a tão famigerada expressão.

Cheguei apenas à gênese do pensamento que me conduzia para a vinculação dessa idéia à idéia de arquétipos femininos e o preconceito masculino inconsciente deles ecorrentes.

O que me diria Cadu a esse respeito? Qual seria a posição de Elissa? O que diria Parrode sobre a magnífica frase?

Por onde anda a turma de Cinema, Diversão e Arte nessas horas?

terça-feira, 13 de julho de 2010

The Holiday

O Amor não Tira Férias - The Holiday (confira o trailler) : Duas mulheres, Iris (Kate Winslet) e Amanda (Cameron Diaz), duas histórias de frustração afetiva. Duas mulheres contemporâneas cansadas de bad romance e uma frase perfeita para reflexão, pronunciada por Arthur Abott (Elli Wallach), velho roteirista de Hollywood, dá origem ao presente texto:

''Iris, nos filmes tem a atriz principal e a coadjuvante: a melhor amiga. Todavia, posso afirmar que você é a atriz principal, mas por alguma razão que não se justifica, você está agindo como a melhor amiga (a coadjuvante).''


O que faz com que mulheres bonitas, independentes financeiramente, realizadas profissionalmente se coloquem no papel de 'melhores amigas' ou atrizes 'coadjuvantes'? Por que algumas mulheres 'atraem' esse tipo de situação?

Fácil observar que diversos são os  fatores que podem levar uma mulher a colocar-se no papel de coadjuvante, fatores sociais, culturais e individuais. Difícil é fazê-las perceber que essa é uma escolha delas, ainda que inconscientemente.

Vivemos numa sociedade - a ocidental - marcada pela tradição judaico-cristã que esquartejou a mulher em pelo menos três partes, a saber: a puta, a santa e a pecadora redimida. Daí se depreende pelo menos três arquétipos femininos.

 
 A figura da santa,  representada por Maria, mãe de Jesus que de tão pura concebeu por meio do Espírito Santo. Devotada ao filho, Maria não tem outra identidade senão aquela da boa moça que fecundada por milagre gerou e deu a luz ao Filho de Deus. Maria é, portanto, assexuada. Maria não está em questão no filme que ora analisamos.




A pecadora redimida é na verdade a mãe de todo o pecado e de todas as culpas que as mulheres carregam nos ombros por séculos. Nada mais, nada menos que Eva. Aquela que, por fraqueza, por curiosidade e  por  desobediência não apenas comeu do fruto proibido: da árvore do conhecimento, como também induziu o marido a fazê-lo causando um enorme e irreparável dano à família: a expulsão do paraíso. Por tal pecado foi condenada - e condenou - todas a mulheres do planeta, ''por  ordem do Criador'', a sangrarem todos os meses, sentirem dores ao parir e os homens a trabalhar para se alimentar. Sua culpa e seu arrependimento foiram tamanhos que tornou-se a esposa obediente e a companheira fiel dali em diante.



 E a Puta? Bem, essa é representada po Lilith - a mulher demônio. Embora alguns antigos livros sagrados do judaísmo falem nela, como o Talmud, a Bíblia omite sua existência. Lilith teria sido a primeira esposa de Adão. Aquela que percebendo a submissão que lhe queria impor Adão, rebelou-se e questionou. Não satisfeita, partiu em busca de outras possibilidades. Lilith é a mulher que se permite o prazer e que luta por igualdade. Lilith - a mulher demônio. Lilith, a puta. 




 Ao separá-las em três arquétipos distintos, as mulheres foram também partidas. Ao longo dos séculos tinham de escolher - como têm até os dias de hoje - entre viver o prazer sexual e a igualdade social/profssional ; ser a esposa devotada, companheira e obediente e; a mãe dedicada à prole. Resultado: identidades esfaceladas, conflitos internos. 

Mas por que estou trazendo arquétipos femininos para falar sobre a frase do filme? Procuro refletir, na verdade, a escolha - inconsciente - é verdade, de Iris, de Amanda e de muitas mulheres.

Incapaz de sustentar a idéia de ser una, a mulher que optou por ser Lilith não consegue realizar-se como Eva e/ou como Maria. Assim também, aquela que optou pela identidade de Eva - Amélia - não se realiza profissionalmente de forma plena; assim também as dedicadas mães, que após a maternidade perdem-se nesse mandato inconsciente de assexualidade.  

No caso do filme, Amanda é  Lilith que talvez inconscientemente acredita que Liliths não podem viver no paraíso, sem abrir mão de sua independência e sem abrir mão de seu prazer. Por isso, mesmo rica, bonita e profissionalmente bem sucedida atrai homens que provem que sua crença é verdadeira: homens infiéis, neste caso. OU pior que isso, Amanda não permite intimidade, não se entrega ao relacionamento e, se ele não é infiel, torna-se infiel por não sentir-se parte da vida dela. Confirma-se a crença: Lilith não pode ter prazer, igualdade E felicidade numa relação a dois. A crença - como construção cultural e pessoal - confirma-se na vida de Amanda.

Iris, por outro lado, é uma mulher sensível, que se entrega ao relacionamento com um homem que não a ama. Ela é uma profissional mediana, com uma vidinha igualmente mediana. Embora tenha inteligência, sensibilidade e humor suficientes para ser uma profissional bem sucedida e independente.Embora seja uma bela mulher, age com subserviência em relação ao parceiro que a tem quando e como quer. Iris é uma mulher obediente e bem comportado, que espera - inconscientemente - ser recompensada por seu bom comportamento com o título magnífico de esposa. Iris quer realizar o ideal de Eva. E como tal traz em si a culpa do pecado original, que a faz crer que por ser culpada não tem direito a ser tratada com respeito, consideração e afeto reais. Iris se desdobra em subserviência para merecer seu lugar de esposa. E, por ser tão disponível e 'amiga', torna-se a segunda opção, a amiga compreensiva, a atriz coadjuvante de sua própria estória. 

Sim, Iris escolheu ser coadjuvante, como muitas mulheres têm escolhido. Nada justifica sua escolha, mas a confirmação da crença de que a mulher é culpada pelo pecado original e que apenas sendo obediente, compreensiva e subserviente pode merecer o título de esposa - pior - que seu valor está atrelado a tal título que a valida como mulher e que somente pode ser dado pelo outro (o homem), explica. Ela deixa de ser o ser que É, e passa a refletir a imagem que o outro faz dela, ou talvez melhor, a projeção de sua auto-imagem distorcida. 

Para Iris, Amanda e tantas  mulheres deste século, esses arquétipos, as crenças e as impregnações são tão fortes que as fazem repetir padrões de comportamento que apenas reforçam o que a cultura, a sociedade e a experiência lhes tem ensinado ao longo dos séculos.  Por sorte, hoje, algumas mulheres vêm desconstruindo Amélia    seja por meio de psicoterapia, seja através de trabalhos de corporificação da consciência, seja por pura e simples rebeldia.





Para saber mais sobre os três arquétipos:
http://www.templodoconhecimento.com/portal/modules/smartsection/item.php?itemid=431

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Eu e o Cinema

''Eu adoro essa parte. A luz vai se apagando devagarzinho. O mundo lá fora vai se apagando devagarzinho. Os olhos da gente vão se abrindo e daqui a pouco a gente não vai mais nem lembrar que tá aqui. (...) A gente vai conhecer um monte de pessoas novas, um monte de problemas que a gente não pode resolver, porque só eles podem. Vamos ver como e quando'' (Lisbela, em Lisbela e o Prisioneiro).

Cinema essa mágica luz que alumia almas e faz viajar por lugares nunca antes visitados, por estórias improváveis ou verdadeiras - narradas de modo encantador  ou apenas documentadas. Cinema que embalou sonhos e desejos. Cinema que foi o caminho  para fazer amigos numa cidade desconhecida para a qual me mudei há alguns anos atrás e que me possibilitou publicar os primeiros textos no Arcamundo.

Naquele tempo, a saída que encontrei para me enturmar foi o Orkut. Lá encontrei a comunidade Cinéfilos de Goiânia, onde, insistente, participava de debates havidos entre seis cinéfilos verdadeiramente aficcionados eteimosos. E eu era a mulherzinha de Brasília - brasilienses estão para goianos assim como paulistas estão para cariocas, não necessariamente nessa mesma ordem - que ficava furando os debates, dando palpites e provocando a discórdia nas até então discussões exclusivamente masculinas da comunidade.  Foi um tempo maravilhoso e sou imensamente grata pelas inestimáveis lições aprendidas com Rafa, Rafa Parrode, Vini, Cadu, Fabrício, Valber e André. 

Claro que tantas discussões on-line acabaram por incentivar encontros reais - sempre em cinemas locais -  com ótimas discussões em barzinhos da cidade. Depois algumas figuras inesquecíveis se juntaram ao grupo: Camila - a mãe do Arcamundo - Elissa, guerreira incansável das causas de esquerda e algumas namoradas que vinham e iam.  Por fim, criamos nós mesmos uma nova comunidade: Cinema, Diversão e Arte que resiste bravamente no Orkut até hoje. 

Mas para quê essa história toda, afinal? Tudo isso é um pouco para matar saudades dessa turma com a qual há muito não tenho contato e muito é para dizer da importância e do meu afeto e gratidão por eles e pelo cinema.

Embora não seja uma crítica do gabarito de Fabrício ou Parrode, sou o tipo que analisa num filme aspectos da construção das personagens e sua coerência, além de ser aficcionada pelos roteiros e seus textos maravilhosos. Sou ligadíssima em frases de cinema, razão pela qual não resisti dia desses e adquiri um livro chamado '' Os Melhores Diálogos do Cinema'' de P.Fendler.  Não sei se posso concordar com o autor sobre serem os melhores diálogos, mas certamente a maior parte dos textos selecionados pelo autor são muito bons, tão bons que decidi escrever - a partir dos diálogos selecionados por Fendler - crônicas ou contos, quem sabe.

O livro traz 229 diálogos do cinema. 229 pérolas dos clássicos aos contemporâneos. E vou escrever a partir da próxima terça-feira (homenagem ao Arcamundo) sobre os 229 textos selecionados por Fendler. A cada nova terça-feira, um novo texto. Espero que findos os 229 tenhamos outros 229 sugeridos pelos leitores do Blog para que possamos seguir surfando nas maravilhosas frases de cinema.

Nosso primeiro diálogo será o do filme The Holiday. Aguardem! 

P.S. Esse projeto dedico a@s amig@s de Cinéfilos de Goiânia, a@s companheir@s do Arcamundo, em especial Vini, Cadu e Camila.