domingo, 30 de novembro de 2008

Toda Mulher Tem Direito a Não ser Triste...

''Solidão
De manhã
Poeira tomando assento
Rajada de vento
Som de assombração
Coração
Sangrando toda palavra sã(...)''
(Djavan)



O que há de comum entre alguns relacionamentos e terrenos baldios? Não saberia dizer, até que num desses dias em que a tristeza abafa toda esperança, em que nuvens cobrem o Pão de Açúcar, me caiu nas mãos um texto cujo título é ''Guia de Terrenos Baldios de São Paulo''. Não poderei dar crédito ao autor, não posso sequer citar a publicação. Uma página, apenas esta página veio ter comigo a tal interatividade da leitura.


Não pude deixar de refletir sobre essa estranha relação entre alguns relacionamentos e os terrenos baldios. Dizia o autor, veja só, que os terrenos baldios estão entre os únicos lugares da cidade que não estão ligados à realização de um projeto, ainda que tenham proprietário e sua existência esteja relacionada a planos de urbanismo - passados ou futuros - estão ali, parados, ao sabor do vento e do tempo.


Alguns relacionamentos também, como os terrenos estão ao sabor do vento e do tempo. Não estão ligados a qualquer projeto, vivem dos escombros de projetos passados - quase sempre fracassados - avessos a projetos futuros - quase sempre assustadores. Neles não há nada, ainda assim podem ser lugares de possibilidades em que se vive a ilusão - ou não - de sentir-se livre.


O autor ainda diz, com propriedade quase filosófica, que os terrenos baldios são terrenos que ficaram sem sentido entre novas comunicações. Com os relacionamentos antigos é bem possível que seja assim, muito embora possa dizer de relacionamentos recentes que ficam sem sentido quando uma das partes se dá conta de que o relacionamento está calcado em espaços vazios, em buracos na alma.


Os relacionamentos baldios nem sempre são escondidos, aliás, acontece com frequencia que sejam populares. Transitem por toda parte esbanjando certa sintonia, mas na verdade são terrenos baldios, vazios de sonhos como todos os outros, reflexo da solidão a dois. Outros estão relacionados a conflitos ocultos, estão repletos de resíduos arqueológicos ligados a algum fracasso. São expressão de disputas de poder, em lugar de manifestação espontânea de afetos.


Em geral tais terrenos, digo , relacionamentos carecem de manutenção, neles se pode, como defende o autor do guia, observar processos de decadência, mistura e entropia que se escondem no resto da cidade. Quase todos os relacionamentos baldios são lugares sem proteção, que podem desaparecer. Quase tudo é possível, porque neles não há nada.


Podem desaparecer por meio de reorganizações quando se encontra um sentido para a área e um projeto floresce, embora só aconteça quando são limpos e cuidados, ervas daninhas arrancadas, teias de aranhas e peças arqueológicas minimamente catalogadas para que não assombrem as construções que porventura sejam feitas. Ou pela assunção de que são espaços selvagens, por meio da aceitação de que são - e querem continuar sendo - livres e vazios.





Maria Cláudia Cabral

Respeite os direitos do autor. Se for citar, dê crédito.

sábado, 18 de outubro de 2008

Toda Mulher tem direito a realizar seus sonhos...








''A construção do casal é um projeto comum aos dois, e eles nunca terminarão de confirmá-lo, de adaptá-lo e de reorientá-lo em função das situações que forem mudando. Nós seremos o que fizermos juntos'' (Dorine em Carta à D., de André Gorz)






Hoje conheci um casal que reafirmou seus votos depois de vinte e dois anos de união estável. Sim, eles se casaram, ou melhor, converteram a união de fato em casamento. A epopéia no judiciário, contada pela esposa, é caso a parte e merece texto próprio. O que me desafia a reflexão é, nos dias de hoje, um casal jovem, depois de duas décadas compartilhando espaço, dividindo despesas e construindo uma história comum, com filhos, bens, alegrias, tristezas e obstáculos superados, desejarem converter essa experiência em casamento comme il faut.



Mas afinal o que é este tal casamento, desejado por muitos e muitas e execrado por outros e outras? Em outros textos publicados sobre o tema falo de compromisso social, de contrato com obrigações e direitos, traço inclusive e principalmente um paralelo entre morar junto e casar-se. Vistas de um mesmo ponto. De qualquer vista que se veja o ponto ele pode ser assustador ou encantador.


Há quem restrinja casamento a um conjunto de idéias e ideais como subir ao altar diante de testemunhas e amarrar sua vida e seus desejos eternamente a outro ser, como compromisso jurídico e social ou forca, prisão ou ainda, banição do fabuloso e divertido do mundo dos solteiros. Mais há quem veja como muita responsabilidade, procriação, patrimônio, monogamia. E outras tantas palavras que fazem o casamento bicho-papão mais feio do que pode ser. Cemitérios na cabeça, cada um com os seus.


Há aqueles e aquelas que preferem colorir a idéia com sapatinho de cristal, vestido de noiva, flor de laranjeira e recepção para quinhentos convidados. Há ainda os que enquadram a experiência numa bela fotografia de 'família feliz' ou numa propaganda de margarina. São os olhos de quem vê. Cada um com suas crenças e seus mandatos.



Do alto de duas uniões, penso que casamento é escolha e, se escolha, pressupõe liberdade. É preciso ser livre de preconceitos, de jugos sociais, de idealizações e modelos preconcebidos para entender o casamento como escolha. Casamento, concordo com Dorine, é união de esforços para a construção de algo comum aos dois. Precisei de muitos anos, tantos quantos vivi, para chegar a esta conclusão.



Não creio que casamento é compartilhar espaço, coabitar. Há quem coabite e não esteja casado. Ao viver com minha irmã não estou casada com ela. Tampouco se restringe a dividir despesas, posso dividi-las com um colega de quarto ou numa república de amigos. Logo, suponho que compartilhar espaço e dividir despesas não significa casar-se. Pensar assim, a meu ver, é diminuir o sentido do vocábulo, reduzir seus significados. Mediocrizar.


Aliás, casamento sequer pressupõe compartilhar espaço ou dividir despesas. Prescinde, em alguns casos, de um, de outro e às vezes até de ambos.



O que estrutura o que chamamos casamento, em minha modesta e mutante opinião é o projeto comum. A construção de algo que ambos acreditam e o investimento que fazem juntos nisso. Como todo projeto demanda revisão, reorientação, adaptação. Isto porque somos seres em movimento, vivendo num mundo em que permanente só a mudança.



Rever projetos faz parte e ai daqueles que não fazem periodicamente suas revisões. Ai daqueles que acreditam que para a vida inteira é um conceito literal e imutável. Esses, por um lado pensam que casamento é compromisso, em seu pior sentido: forca, prisão, rua sem saída. Noutro sentido que é sonho, devaneio e prescinde de qualquer investimento pessoal para realizar-se. Basta a família reunida em torno de uma bela mesa de café da manhã e férias uma vez por ano na praia.



Os celtas, povo sábio, renovava os votos a cada solstício. Para os que entendem casamento como união, construção e projeto de vida, a sabedoria celta se aplica, ainda que não toda primavera e para estes resta após duas décadas renovar os votos e continuar sendo 'feliz para sempre', com a maturidade de saber que sempre não é todo dia e que projeto não é sinônimo de prisão.






Dedico este texto a Leida, uma mulher que usou o seu sagrado direito a realizar sonhos e junto com o companheiro Flávio enfrentou as limitações de nosso sistema judiciário e renovou seu compromisso com um projeto comum: a felicidade de compartilhar espaço, dividir despesas em nome de uma construção conjunta.




Maria Cláudia Cabral



Respeite os direitos de autor. Se for citar ou divulgar dê crédito a autora.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Desejos de Maria



TODA MULHER TEM O DIREITO DE EXPRESSAR SEUS DESEJOS



Desejo  voar
Saltar do décimo andar
Dar piruetas no ar
Loopings em queda livre

Desejo
Controverso,
Arriscado,
Antagônico

 Desejos
Utópicos,
Sonhadores,
Coloridos.

Desejos
Receosos,
Ansiosos,
Assustados,
Reversos.

Asas e desejos

Voadores e assustados
Suicidas, coloridos
Brincalhões, receosos
Arriscados, utópicos
Sonhadores, controversos
Ansiosos, antagônicos...

Desejos de Maria


'' O tempo do mundo não é o tempo do nosso desejo'' (C.A., jornalista)

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