quarta-feira, 16 de março de 2011

Cinema: Momentos Inesquecíveis de Wall-E



Eu escolho ser feliz! E você?

segunda-feira, 14 de março de 2011

Hoje vou de...Boaventura de Souza Santos: Mais sobre Mulheres

As mulheres não são homens

A cultura patriarcal tem uma dimensão particularmente perversa: a de criar a ideia na opinião pública que as mulheres são oprimidas e, como tal, vítimas indefesas e silenciosas. Este estereótipo torna possível ignorar ou desvalorizar as lutas de resistência e a capacidade de inovação política das mulheres.

No passado dia 8 de março celebrou-se o Dia Internacional da Mulher. Os dias ou anos internacionais não são, em geral, celebrações. São, pelo contrário, modos de assinalar que há pouco para celebrar e muito para denunciar e transformar. Não há natureza humana assexuada;
há homens e mulheres. Falar de natureza humana sem falar na diferença sexual é ocultar que a “metade” das mulheres vale menos que a dos homens. Sob formas que variam consoante o tempo e o lugar, as mulheres têm sido consideradas como seres cuja humanidade é problemática (mais perigosa ou menos capaz) quando comparada com a dos homens. À dominação sexual que este preconceito gera chamamos patriarcado e ao senso comum que o alimenta e reproduz, cultura patriarcal. 


A persistência histórica desta cultura é tão forte que mesmo nas regiões do mundo em que ela foi oficialmente superada pela consagração constitucional da igualdade sexual, as práticas quotidianas das instituições e das relações sociais continuam a reproduzir o preconceito e a desigualdade. Ser feminista hoje significa reconhecer que tal discriminação existe e é injusta e desejar activamente que ela seja eliminada. Nas actuais condições históricas, falar de natureza humana como se ela fosse sexualmente indiferente, seja no plano filosófico seja no plano político, é pactuar com o patriarcado.



A cultura patriarcal vem de longe e atravessa tanto a cultura ocidental como as culturas africanas, indígenas e islâmicas. Para Aristóteles, a mulher é um homem mutilado e para São Tomás de Aquino, sendo o homem o elemento activo da procriação, o nascimento de uma mulher é sinal da debilidade do procriador. Esta cultura, ancorada por vezes em textos sagrados (Bíblia e Corão), tem estado sempre ao serviço da economia política dominante que, nos tempos modernos, tem sido o capitalismo e o colonialismo. Em Three Guineas (1938), em resposta a um pedido de apoio financeiro para o esforço de guerra, Virginia Woolf recusa, lembrando a secundarização das mulheres na nação, e afirma provocatoriamente: “Como mulher, não tenho país. Como mulher, não quero ter país. Como mulher, o meu país é o mundo inteiro”. 



Durante a ditadura portuguesa, as Novas Cartas Portuguesas publicadas em 1972 por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, denunciavam o patriarcado como parte da estrutura fascista que sustentava a guerra colonial em África. "Angola é nossa" era o correlato de "as mulheres são nossas (de nós, homens)" e no sexo delas se defendia a honra deles. O livro foi imediatamente apreendido porque justamente percebido como um libelo contra a guerra colonial e as autoras só não foram julgadas porque entretanto ocorreu a Revolução dos Cravos em 25 de Abril de 1974.



A violência que a opressão sexual implica ocorre sob duas formas, hardcore e softcore. A versão hardcore é o catálogo da vergonha e do horror do mundo. Em Portugal, morreram 43 mulheres em 2010, vítimas de violência doméstica. Na Cidade Juarez (México) foram assassinadas nos últimos anos 427 mulheres, todas jovens e pobres, trabalhadoras nas fábricas do capitalismo selvagem, as maquiladoras, um crime organizado hoje conhecido por femicídio. Em vários países de África, continua a praticar-se a mutilação genital. Na Arábia Saudita, até há pouco, as mulheres nem sequer tinham certificado de nascimento. No Irão, a vida de uma mulher vale metade da do homem num acidente de viação; em tribunal, o testemunho de um homem vale tanto quanto o de duas mulheres; a mulher pode ser apedrejada até à morte em caso de adultério, prática, aliás, proibida na maioria dos países de cultura islâmica.



A versão softcore é insidiosa e silenciosa e ocorre no seio das famílias, instituições e comunidades, não porque as mulheres sejam inferiores mas, pelo contrário, porque são consideradas superiores no seu espírito de abnegação e na sua disponibilidade para ajudar em tempos difíceis. Porque é uma disposição natural. não há sequer que lhes perguntar se aceitam os encargos ou sob que condições. Em Portugal, por exemplo, os cortes nas despesas sociais do Estado actualmente em curso vitimizam em particular as mulheres. As mulheres são as principais provedoras do cuidado a dependentes (crianças, velhos, doentes, pessoas com deficiência). Se, com o encerramento dos hospitais psiquiátricos, os doentes mentais são devolvidos às famílias, o cuidado fica a cargo das mulheres. A impossibilidade de conciliar o trabalho remunerado com o trabalho doméstico faz com que Portugal tenha um dos valores mais baixos de fecundidade do mundo. Cuidar dos vivos torna-se incompatível com desejar mais vivos.



Mas a cultura patriarcal tem, em certos contextos, uma outra dimensão particularmente perversa: a de criar a ideia na opinião pública que as mulheres são oprimidas e, como tal, vítimas indefesas e silenciosas.



Este estereótipo torna possível ignorar ou desvalorizar as lutas de resistência e a capacidade de inovação política das mulheres. É assim que se ignora o papel fundamental das mulheres na revolução do Egipto ou na luta contra a pilhagem da terra na Índia; a acção política das mulheres que lideram os municípios em tantas pequenas cidades africanas e a sua luta contra o machismo dos lideres partidários que bloqueiam o acesso das mulheres ao poder político nacional; a luta incessante e cheia de riscos pela punição dos criminosos levada a cabo pelas mães das jovens assassinadas em Cidade Juarez; as conquistas das mulheres indígenas e islâmicas na luta pela igualdade e pelo respeito da diferença,transformando por dentro as culturas a que pertencem; as práticas inovadoras de defesa da agricultura familiar e das sementes tradicionais das mulheres do Quénia e de tantos outros países de África; a resposta das mulheres palestinianas quando perguntadas por auto-convencidas feministas europeias sobre o uso de contraceptivos: “na Palestina, ter filhos é lutar contra a limpeza étnica que Israel impõe ao nosso povo”.


Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).

Artigo Publicado na revista Carta Maior, sessão Debate Aberto:

Especial: Mulheres já são 43% do total de cientistas em São Paulo



14/3/2011

Agência FAPESP – Em 2010, das 19.678 solicitações iniciais de apoio à pesquisa apresentadas à FAPESP 42% foram apresentadas por mulheres. O percentual tem crescido continuamente desde 1992, quando foi de 30%.

Segundo levantamento feito pela FAPESP, a taxa de sucesso global, definida como o número de propostas aprovadas dividido pelo número de propostas analisadas no ano, foi, em 2010, de 61% para as mulheres e de 60% para os homens.

Para as grandes áreas de Ciências da Saúde, Ciências Agrárias e Engenharias, observa-se um crescimento forte na proporção de mulheres. Em Ciências da Saúde, o percentual cresceu de 34% em 1992 para 54% em 2010; para Ciências Agrárias, foi de 23% em 1992 para 40% em 2010. No caso das Engenharias, a participação feminina quase triplicou, passando de 8% para 22% no período.

Nas grandes áreas de Ciências da Saúde, Ciências Humanas e Linguística, Letras e Artes mais da metade dos solicitantes é do sexo feminino. Em Ciências Biológicas, a tendência é de crescimento na participação das mulheres, que passou de 42% em 1992 para 48% em 2010.

Entretanto, os dados indicam que, apesar de maioria, há um ligeiro decréscimo do número de solicitantes mulheres nas áreas tradicionalmente com forte presença feminina, como Ciências Humanas, que caiu de 56% em 1992 para 52% em 2010, e Linguística, Letras e Artes, que passou de 57% para 52% no mesmo período. Em contrapartida, o percentual de crescimento é significativo em áreas com forte presença tradicionalmente de homens, como Agrárias e Engenharias.


Leia o relatório completo com gráficos comparativos em:


www.fapesp.br/publicacoes/indicadores/032011f.pdf 

quinta-feira, 10 de março de 2011

Anita Lopes Pós Desencanto

Querido Caio,

Talvez eu não me desse conta do quanto fora importante nossa comunicação. Passado o impacto da confissão que fez em sua última carta, superada a raiva que senti por ter sido enganada por ti, e finalmente consciente de minha desimportância na vida do ''outro'' - aquele cujo lugar ocupastes sem cerimônia ou pejo - percebi o alcance de tua presença em minha vida. Por isso a carta  enviada desde o sul, aquela que não me respondestes. Ainda desejas siga te chamando assim? És ainda o Caio criado para nos fazer próximos? 

Tudo o que se passou em mim nos últimos meses, após a tua confissão, foi um renascer. Anita tal qual me apresentei a ti (a ele?) já não existe. Ela acreditava num homem que mal tinha coragem para olhá-la nos olhos. Aquela Anita viveu surpreendentemente em função das cartas dele, seus dias e horas eram medidos pela medida da frequência com que recebia noticias. Aquela Anita orbitava em torno de um homem que fora criado por ela. Supostamente frágil, supostamente sensível aquele homem sequer lhe reconhecia a existência. 

Ilusão. A culpa jamais fora dele, fui eu quem me abandonou em prol de uma existência acessória às cartas dele. Mas que cartas? Não eras tu que vivia por ele as cartas? E ele, será que vive de fato? 

Não vou dizer-te que foi fácil, querido Caio, olhar para 'meu' universo em desencanto. Imaginas como me senti ao perceber o engodo que havia criado para mim? Felizmente tua confissão caiu como uma tampa de bueiro em minha calçada, causou clamor popular por melhores condições e me fez acordar do estado de quase morte em que me encontrava.

Meus olhos voltaram a brilhar. A viagem com a querida Alba ensinou-me tantas coisas. Há novamente sorriso em meu rosto. Sabes que desde que vim morar aqui conheci tantas pessoas interesssantes. Voltei aos chás vespertinos com D. Maroca (e suas histórias incríveis), reencontrei Maria Amélia a exuberante jornalista que me foi apresentada no trabalho, e finalmente me dispus a aceitar alguns dos convites do senhor K. (lembra-se dele?)

Por aqui vou ficando, amigo Caio, por que há vida e vou vivê-la.

Abraço carinhoso de sua,

A.L.

P.S. Saio agora para encontrar o senhor K. Conto-te tudo na próxima missiva.