quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Quarenta e tals





O corpo expressa caminhos percorridos. Corpo liso e rijo só nas modelos de capa, dez ou vinte anos mais jovens. Corpo em decomposição. Corpo marcado, gasto, registrado. Um corpo cheio de histórias, com vincos e vínculos; com saliências, protuberâncias, altos e baixos.

Lucian Freud [desconcertante]
É um corpo, sim senhora! Um corpo com dobraduras. Em que todas as memórias se expressam sem pudor. Já não é um corpo jovem, mas tem alma com a energia infinita da juventude, misturada à imprudência lapidada pelos anos.

Corpo em decadência revela intensidade de desejos e infinitude de desígnios. Pés que pisam firmes o chão por onde passam. Pernas que sustentam o peso das experiências e das lembranças. Coxas roliças que alimentam fantasias em meias rendadas no eterno carnaval. 

Corpo desvela nos quadris o febril movimento das águas turbulentas sob as pontes, a languidez dos lagos e todos os sentidos e os sentimentos. Sensações. Barriga, abrigo e nutrição dos seres que trouxe ao mundo. Saliente, salienta-se. Corpo parido, resgatado.

Arriba, peito aberto: encolhe, expande, segura ondas, sustenta, abraça, acolhe. Peitos que alimentaram o mundo. Mulher de peitos, que aos poucos descansam sobre as costelas [e se derramam]. Já não é jovem e rija; é memória. Carinhos e carícias tecidos em veludos.

Ombros rotos, redondos, voluptuosos, braços finos, mãos pequenas: vincadas, marcadas. Repousa preguiçosa em sua nuca, a  salamandra. Sobe lenta e  sorrateira em direção aos cachos. Pelos envelhecidos, antes negros, agora acinzentados pelas estradas percorridas.

Do alto da cabeça veem-se vales e montes, um rio que corre para o mar. Abre caminho entre os olhos, desvenda o terceiro olhar, mergulha na face que os anos desmancham diante do espelho mudo; mudo. Abre-se num sorriso e volta a criar. Mais uma vez [e outra uma vez] dou à luz. Mulher parideira de idéias.








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