foto: Maria Cláudia Cabral |
''Tudo é uma questão de manter, a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo''
... provocada pelo comentário de uma amiga, vou falar mais detalhamente sobre a tal pausa, confidenciando minha humanidade. As pausas são tão necessárias que mesmo a comunicação pode ser de nós retirada a despeito de toda a tecnologia. Assim foi comigo.
A verdade é que lutei incansável (?) por dois longos meses contra médicos de diversas especialidades, contra minha super-ultra-mega terapeuta e até mesmo contra os sábios conselhos de amigas e de amigos, enfim: lutei contra a fragilidade do corpo que habito. Jurava que eu era muito maior e mais forte.
Arrogante! Achava que era uma rocha. Estive certa de que tinha energia para movimentar fogo, ar, terra e água. Bobagem! A condição humana nos baliza, ainda que teimemos em escapar dela. No limite, no limite o corpo gritou mais alto, e fui a nocaute.
Finalmente rendi-me, ou melhor, fui rendida pelos sábios ensinamentos de que o tempo da vida não é o tempo do nosso desejo, embora possamos escolher o que fazer dele, arcando naturalmente com as consequencias de nossas escolhas. Paguei para ver. Não uma, mas duas vezes. Ainda zonza pelo soco da vida, parei, deixando tudo para trás.
Viajei em busca de aconchego de mãe, de sabedoria de avó, de carinho das irmãs. Escondi-me no interior, em pleno Sertão Central, em meio aos monólitos que imperam no açude do Cedro. Fiz lindas fotos, belos registros. Inclusive - pasmem - da biblioteca local, do museu, da velha estação ferroviária e ainda por cima, fui instada a falar de economia da cultura e turismo. ''Uma vez Flamengo, flamengo até morrer...'' Quando me vi estava ali, parada na porta da biblioteca, tirando fotos de velhas estantes empoeiradas.
Por sorte, meu período de descanso em Quixadá tinha data para acabar. Refleti durante toda a viagem de volta a Fortaleza. Ao chegar a capital, o som das buzinas, o tumulto do trânsito, o suor escorrendo pela testa, molhando minhas mãos, fazendo o coração disparar...Tudo ali. Sabia que fizera meu possível, mas não conseguira desligar-me. Alguém já havia soprado esse segrego em meu ouvido: dez dias não bastam para desconectar-se...
Repita comigo este mantra sagrado: Se não paramos, a vida nos pára.
Providências de humildade tomadas: o isolamento. Só o total isolamento poderia me devolver a energia que perdera não sei bem desde quando, mas sei bem onde e porque. Refugiei-me num pequeno grande pedaço de paraíso*. Sem hora para acordar - embora invariavelmente tenha acordado antes do sol nascer - respeitando todos os meus tempos, acertando o relógio biológico e fazendo nada que não fosse a vivência do momento presente: como um presente.
Pausas fazem parte de viver o presente com intensidade e consciência. Passei muitas e muitas horas comigo mesma, comendo os frutos da terra e do mar coletados ali mesmo, quase na porta de casa. Captei toda a beleza que minha retina pôde registrar, que o zoom da máquina conseguiu alcançar. Respirei muito conscientemente durante esses dias. Pratiquei yoga olhando o sol nascer, mergulhei no mar enquanto o sol se deitava sobre a imensidão. Senti-me envolvida pela paz, acreditem, do canto dos passarinhos, mesmo que para alguns - ou muitos - esta frase pareça deveras piegas.
Fui ressurgindo - do resto que sobrou de mim ou de quem pensara ser, para falar a verdade - a energia veio aos poucos sendo recarregada. E fui me lembrando de fórmulas mágicas para me manter sorrindo, otimista, feliz e cheia de sonhos, de desejos e de esperança. Comecei a lembrar um pouco de quem sou ou um pouco de quem penso que fui. Daí veio o desejo quase infantil de fazer algo extraordinário e a lembrança de que em 2008 não houvera realizado qualquer coisa de realmente extasiante.
Entrou por uma porta e saiu pela outra porque o resto da história vocês já conhecem. Nemo me desligou do resto do mundo, dando um banho de mar e alegria na máquina fotográfica, no celular recém-adquirido... E sabem o que eu fiz? Fui comer camarão frito e tomar água de côco enquanto os aparelhos secavam. Assim passei aquela tarde, olhando o mar, vendo os pescadores chegarem em suas jangadas, brindando a vida com sorrisos e troças. Vi, de perto, que há muita vida fora dos gabinetes, comigo ou sem mim.
TODA MULHER TEM O DIREITO DE RECONHECER SUA ARROGÂNCIA... E RIR DE SI MESMA!
*Agradeço especialmente a meu amigo querido, Rafael, e a seu amigo Marco, que gentilmente me hospedou nesses dias de resgate de mim mesma sem sequer me conhecer. Amizade é tudo na vida da gente - outra frase piegas - tá impossível resistir a elas esses dias.
Maria Cláudia Cabral. Respeite os direitos da autora. Se for citar, dê créditos.