quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

VII - Carta de Anita Lopez a Caio Marques

Caio,

Em plena viagem exploratória de meu novo lar-doce-lar deparei-me com excelentes condições. O clima é ameno e as pessoas simpáticas. A cidade é bonita com suas construções simples e o comércio oferece tudo o que é necessário, além de haver boas opções culturais e artísticas. Há uma belíssima biblioteca aqui e para mim o paraíso tem livros, muitos livros.

Estou hospedada na casa de D. Maroca. Senhorinha muito alegre e falante, viúva e com muitas histórias para contar. Vive com ela seu filho mais velho: José e uma criada mal-criada, que costumam chamar Lerinha. A casa é confortável, tem um belo piano - o que me realiza - e ouço atentamente as histórias da cidade que D. Maroca viu crescer.

Desde muito jovem ela veio de uma pequena vila ao norte da província com seus 12 irmãos e irmãs e a mãe que ficara viúva. Os mais velhos cuidavam os mais novos. D. Maroca era caçula e o mimo de todos. Contou-me que por causa disso tornou-se uma mocinha bem mimada, que tinha todos os desejos realizados no momento em que queria. Não admitia ser menos que o centro das atenções. E era, segundo ela, muito namoradeira. Suas histórias são engraçadas, numa outra oportunidade contarei mais de D. Maroca e suas aventuras na cidade.

Busco por um lugar para chamar de meu. Os imóveis são bons, porém poucos estão disponíveis para aluguel. Além disso, você sabe, ainda hoje uma mulher sozinha é vista com desconfiança em alguns lugares. Aqui é um deles. Por outro lado, convivo há muitos anos com olhares que vão do curioso ao reprovador e isso não costuma me constranger.

Tem sido constante a companhia do senhor K. Ele foi designado pelo escritório central para auxiliar-me na exploração do novo território e tem feito um excelnte trabalho. Seu entusiasmo pela cidade é contagiante e costuma mostrar-me lugarzinhos charmosos onde poderei distrair-me das pressões do dia-a-dia.

Faz sol aqui o ano inteiro e é um hábito local banhar-se nas praias nos finais de semana. Outro hábito delicioso é o de assistir o pôr-do-sol numa velha ponte abandonada ao som de violeiros que poeticamente colocam trilha sonora nesse fantástico espetáculo da natureza.

Senhor K apresetou-me uma boa amiga que algumas vezes nos tem acompanhado. Maria Amélia é extremamente ativa, falante e seus olhos brilham imensos e claros sobre sua pele bronzeada. Ela é inteligente e em poucos encontros já nos tornamos ótimas amigas. Temos muito em comum, embora eu não tenha metade da vivacidade de Maria Amélia. Não há como entrar num salão acompanhada por ela e não ter todos os olhares imediatamente voltados para nós.

Como andam as coisas por aí? Você não tem escrito muito. Sua última correspondência era quase lacônica. Algo o aborrece? Sei que agora estamos mais distantes que nunca, mas foi o que escolhemos afinal. Cuide-se.

Vou ficando por aqui, repleta de boas expectativas quanto a nova vida.

A.L.

2 comentários:

  1. Maria adorei o conto e suas palavras de reflexão sobre a vida no mato.
    O mais dificil para mim nesse pereiodo que morei em meio àquela mata, foi estar comigo mesma dia e noite - um grande desafio.
    bjus e volte sempre viu!

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    1. estar consigo é um grande desafio e uma libertação. quando conseguimos estar conosco como boas companhias podemos tudo. ;-)

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